" Não fale de mim se não sabe o que eu já passei".
Por: Alessandro Buzo
Não posso reclamar da vida, sempre lutei muito e até consegui algumas importantes conquistas.
Nasci e cresci no Itaim Paulista, quando meu pai foi e nunca mais voltou, tivemos que batalhar pra sobreviver. Com 13 anos (em 1985) eu comecei a trabalhar no centro de São Paulo, era um office boy num escritório de contabilidade na Praça da Sê.
Fiquei no pedaço, trabalhava na Rua Silveira Martins, perto da Rua do Carmo / Tabatinguera, foi ali que conheci a cocaína, fui usuário por uma década e foi uma fase de gastos e perdas, o vício toma tudo seu, quase tirou minha vida e antes de perder minha dignidade, fui resgatado.
O que me tirou da escuridão das drogas foi meu casamento (parei de usar droga no noivado) com a Marilda Borges, em setembro vai fazer 17 anos que estamos juntos.
Além dela, conhecer o Hip Hop também ajudou muito. E por fim, já casado (desde 1998), venho o ano de 2000, divisor de águas na minha vida, em março nasceu meu filho e em dezembro lancei meu primeiro livro, falando dos trens de subúrbio da zona leste, linha Brás / Calmon Viana que pegava desde 1985 pra ir pro centro, foram anos de trem lotado, uma escola. O TREM - BASEADO EM FATOS REAIS mudou minha vida, passei a ser "escritor da periferia" e isso não era tão comum (com graças a Deus é hoje) naquele tempo.
Eu morava no Rua do Buraco no Jd Camargo Velho, pra alguns, Favela do Buraco. Antes cresci no Jardim Olga e morei uma década no Encosta Norte, sempre no Itaim que é o Paulista e não o Bibi dos boy.
Desde meu noivado passei a morar na Rua do Buraco, na casa da Marilda. Construímos uma casa de dois cômodos onde moramos por 10 anos, no fim desse tempo não aguentava mais uma casa tão pequena, já era conhecido no Hip Hop e na literatura e quando a imprensa ia me visitar pra alguma entrevista iam na minha casa e o assunto passava a ser a casa, no primeiro cômodo grafitado era cozinha, sala e meu escritório. Atrás o córrego fedendo nos dias de calor.
Pra não receber todo mundo em casa que nasceu em 2007 a Livraria Suburbano Convicto. Ficou lá na quebrada (Rua Nogueira Vioti) até 2010 quando foi pro Bixiga, (fugindo de 3 anos no vermelho e chance grande de falir), aliás só não faliu porque sempre fazia outras coisas paralelo.
Em 2008 numa jogada de risco, resolvi morar mais próximo do centro pra impulsionar os trabalhos que estavam pintando, fiz da Casa Verde a minha nova quebrada, um Suburbano Convicto fora de seu habitar natural, mas sem deixar de ser Suburbano, minha relação com o Itaim Paulista segue, toda semana vou lá, segui promovendo no Dia das Crianças o evento Favela Toma Conta.
Nunca foi fácil, sempre foi luta. Depois do primeiro livro em 2000, passei muita dificuldade nos anos seguintes, foi difícil viver 2001, 2002, 2003.... só em 2004 lancei meu segundo livro.
Até 2007 segui correndo no cultural e no horário comercial vendia alimento pra sobreviver. Só a partir de 2008 que larguei os atacadistas de alimento pra me dedicar só as coisas culturais, mudei pra Casa Verde, fiz minha estreia na TV no Programa Manos e Minas de TV Cultura. Só a partir dai que minha vida melhorou um pouco.
Nesses 14 anos de carreira, foram 11 livros meus, outros 7 que organizei, 18 livros, média de mais de um por ano.
Fiz ainda um filme (Profissão MC em 2009) sem captar um único real.
O meu evento "Favela Toma Conta" no Itaim Paulista passou a ser anual, só no dia das crianças, em 10 anos (2004 / 2014) foram 28 edições realizadas, fazendo do FAVELA um evento de rua tradicional.
Minha Livraria resiste a 8 anos sendo a única do país especializada em Literatura Marginal.
Na Livraria Suburbano Convicto nasceu o Sarau Suburbano que vai completar 5 anos e é semanal, hoje é um dos saraus mais importantes do circuito, a periferia no centro (Bixiga, Terra da Vai Vai).
Depois de 3 anos de TV Cultura (2008 à 2011), passei outros três na Rede Globo, levei a cultura da periferia pro grande público do SPTV 1a edição, esses três anos me tornou um cara super-popular, sou reconhecido e cumprimentado nas ruas todos os dias, faz parte.
Os 6 anos na TV me tornou o cara de "todas as quebradas", eu deixei o rótulo de "o cara do Itaim Paulista", passei a circular por toda cidade, todas regiões, fundão da leste, oeste, norte, sul.
Fora da TV (desde setembro/2014), estou reinventando minhas prioridades, com toda essa trajetória na literatura, Hip Hop e TV, não fiquei rico, mas mudei minha vida.
Vivo bem mais próximo da minha família, do meu filho, mesmo com a agenda sempre cheia, posso tomar o café da manhã sempre em casa, posso fugir do horário de pico.
Não fiquei rico, mas comprei um carrinho popular (Novo Uno), zero kilometro em novembro/2011. Foi nessa data que tirei minha habilitação (aos 39 anos), antes não dirigia, só andava de ônibus, trem e metrô. Só tenho carro e dirijo a 3 anos e 4 mêses.
Mas meu sonho de consumo sempre foi a "CASA PRÓPRIA". Qual brasileiro nascido na periferia não sonha com uma.
Meu sonho era ter uma casa no Itaim Paulista, meu bairro de origem e coração. Depois sonhei em comprar uma casa no bairro onde moro hoje, a Casa Verde, quase deu certo.
Sabia que tinha que aproveitar o tempo que eu estava na mídia, pra realizar esse grande sonho da minha vida pessoal, a vida profissional eu quero lançar mais livros, fazer mais filmes, só que já realizei maioria dos sonhos. Hoje tenho novos sonhos.
Já sonhei em não trabalhar mais de empregado das 8h às 18h, realizei.
Já sonhei em não pegar mais trem e metrô lotados no horário de pico da manhã e da tarde, realizei.
Sonhava ser um pai presente, realizo esse sonho todo dia.
Faltava a cereja do bolo, a "CASA PRÓPRIA".
Quis o destino que eu passasse a frequentar o litoral norte de SP e suas lindas praias. E quem pode lutar contra o destino, acabei comprando um terreno no litoral norte. Resolvi murar o terreno que é grande, depois passo a passo fui construindo, enquanto eu me matava de trabalhar na TV (quadro semanal no SPTV) e contratações paralelas, um ano e meio de UNINOVE com eventos, saraus e quadro no YOUTUBE (FALA AÍ UNINOVE), paralelo eu fui construindo no meu terreno, realizando a cada bloco o sonho.
Eis que em dezembro de 2014 (no Natal) eu cai pra dentro, tenho uma casa.
O ano de 2015 começou cheio de incertezas, "desempregado" a 6 mêses, vivo das minhas contratações pra palestras, curadorias .
Quando saí da Globo imediatamente enxuguei minhas despesas, mais ainda é muita coisa..... (2 alugueis, Casa Verde e Bixiga) e dezenas de contas como alimentação, contador, impostos, convênio médico, IPTU no litoral, IPVA do meu carro, gasolina entre outros....
Não fiquei rico em 14 anos de carreira, mas conquistei algumas coisas.
O momento atual é de trabalho pra manter tudo funcionando.... mas é luta pela sobrevivência, sempre foi.
Talvez hoje eu seja mais famoso, tenha certas facilidades que conquistei, mas é luta e eu nunca fugi da luta.
Mas 2015 pra frente é uma nova etapa, todas as anteriores tinha como foco comprar uma casa, sonho realizado.
Agora é pensar novas metas, talvez um carro novo, poupar algum troco pro futuro, quem sabe uma casa em São Paulo.
Mas apesar de "desempregado", me sinto hoje um homem (nunca artista) realizado.
Tenho uma esposa que eu amo, um filho lindo e uma casa na praia onde pretendo envelhecer, sem stress, trânsito e o caos da capital.
Hoje já fico 50% em SP e 50% do tempo na praia, agora estou fazendo um campinho no quintal.
A cada ano quero passar a ficar em São Paulo só a trabalho e morar de vez no litoral norte, no máximo quando eu completar 50 anos (daqui 7 anos e meio).
Esse sou eu, essa é a minha vida.
Não fale de mim se não sabe o que eu já passei. Diria o Benito de Paula.
Sonhos novos não faltam..... viajar pelo mundo é um deles, o futuro a Deus pertence.
Alessandro Buzo
escritor, cineasta e sobrevivênte.
www.buzo10.blogspot.com
Twitter: @Alessandrobuzo
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